O diretor Bruno Safadi apresenta uma fantasia cômica sobre um
prefeito carioca com sonho de grandeza que quer separar o Rio do resto do
Brasil. Talvez o tal prefeito seja apenas a projeção de um mendigo (que aparece
em algumas cenas), mas isso nunca fica muito claro. A rigor, o sujeito era atendente
de farmácia e começou na política por acaso, de forma levemente escusa; jamais
abandonaria o hábito. Mas se ele corrompe ou é corrompido, é por uma causa
maior, já que tem as melhores intenções: possui o sonho genuíno de tornar o Rio
a cidade agradável e importante que tem potencial para ser. O caminho para isso
é trazer a capital fluminense de volta ao seu passado glorioso – até o palácio Monroe
(derrubado nos anos 70) ele planeja reconstruir.
O filme é especialmente tocante porque as aspirações do
prefeito parecem um pouco com as de Safadi enquanto artista; são dois saudosistas
irremediáveis. Mas o pior do cinema de Safadi está nessa sua constante e
repetitiva reverência aos seus grandes mestres, Júlio Bressane e Rogério
Sganzerla. É como se ele se se auto-atribuísse a missão de ser o responsável por
uma retomada do projeto estético da dupla nos tempos que atuavam juntos na
produtora Belair, em 1970 (Safadi, aliás, já fez um documentário sobre o tema). Mas eram outros tempos... O cineasta deveria era manter o foco em sua própria estética, porque o cinema
dele tem, sim, um frescor próprio. O cineasta tem facilidade de criar imagens
expressivas e altamente líricas, mesmo em pequenos detalhes – em uma cena, o
personagem de Nizo Neto (em formidável performance) tira uma foto em Polaroid.
A imagem é congelada assim que o flash é disparado, mas a luz continua a ser expandida,
em câmera lenta; é um efeito puramente sensorial, mas tem grande força poética. Há também várias outras ideias visuais muito curiosas (conversas de gabinete são mostradas em fotos em still, provavelmente em uma citação a "A Queda", de Ruy Guerra e Nelson Xavier).
Mas se os filmes de Safadi costumam ser satisfatórios em termos visuais, nem sempre o são no campo das ideias. Dão uma certa sensação de
material pouco desenvolvido, resolvido na base da pressa e com algum desleixo –
talvez em nome de uma estética propositadamente “despreocupada”, vai saber... Ou é possível que
por desejo de passar logo a um novo projeto. Seus filmes sempre têm aquele tipo de incompletude
que é o mal de muitos curtas-metragens; chega-se ao fim sem a sensação de estar
diante de um produto artístico pleno. Falta algo.
Esse algo faltante certamente não é humor e nem criatividade
– isso, Safadi tem de sobra. O filme é divertido, vivo, lírico. Faz parte de um
projeto capitaneado por Júlio Bressane, chamado “Tela Brilhadora”, só com obras
de baixíssimo custo, mas o conceito não fica claro aqui – não se compreende do
que se trata nem como o filme nele se insere. Mas pouco importa: “O Prefeito”,
apesar da falta de plenitude, se sustenta bem como peça autônoma.
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